domingo, 13 de novembro de 2011

FICA BEM COM DEUS QUEM SABE CANTAR




FICA BEM COM DEUS QUEM SABE CANTAR
Por Fábio Brito

Está chegando a hora de assistir a mais um show de Ithamara Koorax. Ansiedade é palavra bem limitada para descrever o que já começo a sentir. Tomara que, mais uma vez, nossa diva cante Fotografia. Explico por quê. Certa vez, no sofisticado Sofitel, um hotel de Copacabana, quando ela anunciou que cantaria essa maravilha jobiniana, não me contive: imediatamente, olhei para o mar, e a lua estava, como sempre, soberana. Que beleza! Foi um dos momentos mais bonitos de todos os shows a que já assisti: “Eu, você, nós dois / sozinhos neste bar à meia-luz / E uma grande lua saiu do mar...”. Eu não precisava de mais nada naquele momento: uma canção de Jobim, a voz da Ithamara e uma boa companhia.
Sempre digo – afirmo categoricamente! – que, depois de um show da Ithamara, minha vida muda bastante. Muda muito! Porque associar talento e bom gosto na escolha do repertório é algo raro, dificílimo. Há muitos por aí que até têm vocação (ou ‘faro’) para a escolha de repertório, mas lhes falta talento para o canto. Há ainda os que até sabem cantar, mas cantam uma “musiquinha” que é nada. E, por fim, há os que não sabem cantar (mal sopram ‘no’ microfone) e têm um repertório que é uma indigência só. Aí é uma “desgraça total”! Claro que, para esse povo, os estúdios, ultimamente, dispõem de aparelhos e mais aparelhos que “afinam” a voz e fazem outros milagres. Com essas facilidades todas, conseguem chegar ao tal “sucesso” e vendem à beça. No entanto, graças aos deuses, assim como o mercado põe alguém no topo de forma meteórica, também o condena ao desaparecimento com a mesma velocidade. Isso é um alívio, embora algumas “criaturas” estejam demorando muito para sair de circulação. Até quando, meu Deus?!  
É bom reafirmamos: não se constroem carreiras sólidas de repente. Há que se ter, além de muito talento, disposição para pôr o pé na estrada. É! Sem se ganhar o mundo, é difícil, aqui no Brasil, um cantor talentoso sobreviver somente de seu trabalho. Ithamara é prova de que o excelente intérprete brasileiro é muito mais valorizado fora daqui. Sobre isso, vale transcrever um fragmento de “Meus discos e nada mais – memórias de um DJ na música brasileira”*, de Zé Pedro: “(...) Os santos de casa não fazem milagres por aqui. Mas o famoso jeitinho south american way de ser sempre resolveu esta questão: se não rola por aqui, bye bye, Brasil. Auf wiedersehen. O samba da minha terra, quando se canta lá fora, todo mundo bole. Ithamara sabe disso. (...) Seus discos são de um preciosismo que a coloca em situação de igualdade com qualquer cantora do mundo. Por isso virou paixão mundial (...) Ithamara Koorax tem seguido em frente. Seus álbuns saem com frequência lá fora. Uma discografia impecável. Músicos do mundo inteiro trabalham com ela”. Dizer mais o quê?
 Há sempre muito o que se dizer sobre essa estupenda intérprete brasileira e do mundo. Dizer, por exemplo, que, atualmente, não há intérprete no mundo cuja voz chegue perto da de Ithamara. Ela é a melhor e estamos conversados. Basta ouvi-la para se constatar o que estou dizendo. Preciso ainda dizer que Ithamara não sai daqui de casa e de minha vida. No carro, por exemplo, ouço-a direto, mas tenho sempre o cuidado de não deixar qualquer rádio sintonizada. Desprogramei o rádio (os ouvidos sempre estiveram desprogramados para as músicas ruins). Se, porventura, entre um CD e outro, eu tiver de ser submetido a algum som, prefiro ouvir um chiado qualquer a ter de suportar alguma “deusa do axé” ou algum “sertanejo universitário”. Deus me livre! Tenho engulhos só de pensar que, algum dia, eu possa ser torturado com isso que, hoje, empesteia as rádios brasileiras. Ah, Ithamara, “se todos fossem iguais a você... que maravilha viver”.   

*Pedro, Zé. Meus discos e nada mais: memórias de um DJ na música brasileira. São Paulo: Jaboticaba, 2007.

           
            A ALMA BRASILEIRA
            Por Armando Nogueira

           No fim de semana, fui ao show musical da cantora Ithamara Koorax, por sinal, um portento de intérprete. O canto de Ithamara é precedido de um texto, lido em off, dedicando o espetáculo "a todos os artistas que nunca aceitaram barreiras ou limites à sua arte". O show encerra uma bela exaltação aos artistas brasileiros que, por falta de estímulo doméstico, acabam tendo que se exilar, levando seu talento ao resto do mundo, que os acolhe com entusiasmo.
          Quando terminou o maravilhoso desempenho da cantora - realmente, um fenômeno vocal - eu pensava na diferença de sorte entre o artista e o jogador de futebol. Quem é bom de bola e vai pro exterior é permanentemente louvado como legítimo representante da cultura popular brasileira.
Já o artista, pobre dele, é absolutamente esquecido; quando não é hostilizado, discriminado, tido como trânsfuga, apátrida.
          Deslumbrado com o talento de Ithamara Koorax, eu a via no palco com o santo orgulho de sabê-la celebrada pela revista americana Down Beat como uma das quatro melhores cantoras de jazz do mundo, ao lado de Diana Krall, Cassandra Wilson e Dianne Reeves. De jazz, diz a conceituada publicação; de MPB há de dizer quem, como eu, ouviu Ithamara cantando Tom, os irmãos Valle, Jorge Benjor e tantos outros compositores da MPB. Emociona ouvir cantar Ithamara.
          Se é verdade que cada música tem sua alma, essa admirável cantora tem o dom de criar uma voz que parece ter nascido com a alma da própria canção.
Nunca é demais repetir que os artistas que se apresentam no exterior não mostram apenas a beleza de sua arte pessoal. A imprensa especializada talvez ainda não tenha parado pra pensar que eles expressam, lá fora, em cenários distantes, a própria alma do povo brasileiro. São tão heróicos quanto os idolatrados craques do nosso futebol. Quando Ithamara canta é mais um gol do Brasil.
          
           Fontes:
           "O Estado de São Paulo", 21 de maio de 2003
           http://www.koorax.com/start.htm

2 comentários:

  1. Meu amigo, estou tendo comichões neste momento! Ithamara Koorax é maravilhosa: quanto talento, quanta qualidade; isso de fácil percepção para um leigo e contaminado pelos "meteoros" de minha vida. Oh!, meu Deus, como pude viver e dizer-se feliz sem nunca ouvir Ithamara ou talentos iguais? Mas, meu amigo, sei que isso é passado... rs
    Sofitel, Ithamara, qualidade, talento, cultura... ai vou eu!

    Abração, meu amigo,

    Rodrigo Davel

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  2. Ê... "trem" bom! Sempre há tempo, meu querido, para descobrirmos talentos como a Ithamara. Tenho certeza de que você vai gostar - e muito! - do "show" e da própria Ithamara, claro!
    Uma simplicidade ímpar! Ela não fica "fazendo pose" de prima-dona. E poderia! Abração e obrigado.
    Fábio

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