CONVIVÊNCIA
Por Fábio Brito
Recentemente, na crônica “A
utopia carioca da ‘faixa compartilhada’”, o jornalista Joaquim Ferreira dos
Santos, que muito admiro, escreveu que “desaprendemos a conviver”. Acho que nunca soubemos. Quem tem vizinhos sabe muito
bem do que estou falando. E quase todas as pessoas têm vizinhos, não é mesmo? Não
estou dizendo que vizinhos não prestam! Há vizinhos e há “vizinhos”.
Pois bem, há uns três anos, mais
ou menos, encomendei a um serralheiro um suporte para sacos de lixo, que
finquei em ponto estratégico da calçada aqui de casa. Nos primeiros dias (só
nos primeiros dias!), não houve problemas. Consegui, com tranquilidade, pôr as
sacolas nesse suporte. Com capricho, acondiciono bem o lixo: não raro, uso mais
de uma sacola e amarro bem a “boca”. Assim, evito que o conteúdo seja derramado
e, consequentemente, dificulte o trabalho de quem o recolherá (pois é, penso
nas próximas pessoas que vão lidar com esse lixo. Quando é vidro quebrado,
então, não só acondiciono muito bem o conteúdo, mas escrevo um recadinho
informando tratar-se de “vidro”. Assim, evito que alguém se machuque). Mais: só
levo o lixo para fora nos dias de coleta e, assim mesmo, pouco tempo antes de o
carro passar. Por quê? Porque, mesmo estando o lixo bem acondicionado, podem
surgir moscas etc., etc. (agora, estou pensando nas pessoas que passam pela
calçada, embora o suporte, como eu já disse, fique em ponto estratégico. Ou seja, ele não
atrapalha os transeuntes).
Como, então, começaram a surgir
os problemas, que só aumentam? Conforme eu disse no parágrafo anterior,
encomendei o suporte a um serralheiro e, obviamente, paguei pelo produto, que
não é grande: tem o tamanho ideal para caber o lixo aqui de casa. Fiquei
tranquilo, porque, não mais deixando as sacolas no chão, eu não correria o
risco de alguém as chutar (incrível, “né”?) ou de animais famintos (que pena!) as
rasgarem. Ingênuo, acreditando em utopias como o “respeito a limites”, imaginei
que meus problemas com o lixo haviam cessado. Ledo engano. Eles só estavam no começo.
Pouco tempo depois de instalado o
suporte, numa manhã bem fria de sábado, munido de escova, muita água, luva
e produtos de limpeza, lá estava eu na calçada para limpar o tal suporte. Na
véspera - ou naquele sábado mesmo, de madrugada - uma criatura (há pessoas e há
criaturas!) decidiu usufruir do tal suporte para sacos de lixo. Por que não
compartilhar?, pensei dias antes. Eu não via problemas, desde que alguém, como
manda a boa educação, me pedisse licença. Pedir licença para dividi-lo comigo era o mínimo que eu esperava. “Pra que
somar, se a gente pode dividir?”, como ensinou o “Poetinha”. Eu apenas
alertaria a pessoa sobre a importância de acondicionar bem o lixo e só
depositá-lo nos dias em que o carro passasse, além, é claro, de não ocupar toda
a cesta – pequena – do suporte. Bom, voltemos: por que fui limpar o suporte?
Fui limpá-lo porque o conteúdo
das sacolas (não era apenas uma!) estava simplesmente deteriorando e começou a
escorrer pelo cano que sustenta a cesta, seguindo calçada afora. Com
repugnância, é lógico!, tive de ensacolar o que estava mal ensacado. Para
tanto, usei várias sacolas. Sem ingenuidade (acordei!), pude prever que o
martírio só estava no começo. Não deu outra! Em poucos dias, começaram a surgir
sacolas e mais sacolas. Quase sempre fora dos dias de coleta do lixo, elas
passaram a ocupar considerável espaço na cesta. Num desses dias, estive
envolvido com outra “operação faxina”. Agora, para resolver o problema de
larvas que “fervilhavam” fora de uma das sacolas.
E agora? Desde que instalei o suporte, só tenho tido dor de cabeça. Sempre que vou deixar o lixo lá fora, além de luvas, levo mais sacolas, pois tenho certeza de que vou ter de “concluir o serviço” de meus “sócios”. Diversas vezes, chego a levar o lixo em dias que não são os da coleta. Quando me perguntam o porquê, respondo na hora: “ – Vou garantir minha vez. A concorrência por espaço está acirradíssima”. Desanimador, não? Mais do que desanimador: revoltante! O que fazer? Pensei em tirar o tal suporte. Serrá-lo mesmo! Descartei a ideia. Certamente, continuariam depositando o lixo no mesmo local, porém no chão. Um conhecido sugeriu que eu afixasse um cartaz. Também desconsiderei a sugestão. As criaturas se sentiriam ofendidas, mesmo que eu tivesse (e eu teria!) muito tato, muito cuidado ao escrever. Melhor não contrariar os que desconhecem seus limites. Soltando fagulhas pelas ventas, poderiam, num acesso de “razão”, jogar o lixo dentro do quintal aqui de casa.
Por essas e
outras, dá até vontade de voltar a morar em apartamento. Pensando bem, melhor
descartar essa ideia. Vontade mesmo é de fugir. “Vamos fugir deste lugar, baby”?
Sigamos!