sábado, 14 de janeiro de 2012

VERMELHA OU BRANCA?




REDESCOBRIR
Luiz Gonzaga Jr.

Como se fora brincadeira de roda / memória
Jogo do trabalho na dança das mãos / macias
O suor dos corpos na canção da vida / história
O suor da vida no calor de irmãos / magia
Como um animal que sabe da floresta / memória
Re-descobrir o sal que está na própria pele / macia
Re-descobrir o doce no lamber das línguas / macias
Re-descobrir o gosto e o sabor da festa / magia
Vai o bicho homem fruto da semente / memória
Renascer da própria força a própria luz e fé / memória
Entender que tudo é nosso, sempre esteve em nós / história
Somos a semente, ato, mente e voz / magia
Não tenha medo meu menino povo / memória
Tudo principia na própria pessoa / beleza
Vai como a criança que não teme o tempo / mistério
Amor se fazer é tão prazer que é como fosse dor / magia

Fonte 1 (CD): "Redescobrir", Elis Regina, Saudade do Brasil, WEA, M250678-2, 1989.
             LP gravado em abril de 1980.

           
            VERMELHA OU BRANCA? 
Por Fábio Brito
           
          Fiz minha última caminhada de 2011 em 31 de dezembro. No momento de escolher a roupa, a dúvida quanto à cor da camisa a ser usada: vermelha ou branca? Sem lenga-lengas, sem lengalengar: branco é paz; vermelho é vida. Ponho a vermelha e pronto! Mesmo na guerra, quero é vida. E lá fui... "caminhando e cantando" durante uma hora, uma hora e meia. Detalhe: adoro "cantarolar" enquanto caminho. Ih! Puxo canções e mais canções, o que é um ótimo exercício para a memória.
          Na rua onde caminho, reinava uma paz que só vendo: pouquíssimos carros e dois conhecidos fazendo o mesmo que eu. Nem sinal “daquelas” pessoas que só caminham em dezembro e janeiro. Preferiram a praia. Graças a Deus!, pensei. Quanto menos tumulto, melhor a caminhada. É... caminhada também entrou no circuito do consumo: muitas pessoas caminham só porque "ficou bonito caminhar"... ou porque "os médicos andam dizendo que caminhada é uma atividade deveras importante".
           Bom, mas, no último dia do ano, há outras dúvidas além da que envolve a escolha da cor da camisa para a caminhada: a que DVDs assistir? Que CDs ouvir? Que livros ler? E agora? Não dá para desconsiderar isso, uma vez que nossas primeiras atitudes no primeiro dia do ano (e no último também) parecem nortear todos os outros. Pura superstição, dirão alguns. Tudo bem. Sou supersticioso. Quanto aos livros, não tive dúvidas: continuei com "Silenciosa algazarra", de Ana Maria Machado. Reflexões sobre leitura e escrita são sempre bem-vindas.  Taí um assunto do qual não me canso e com o qual "atormento"  a vida de muita gente. No entanto, não deixei de "dar uma passada" por Drummond, Clarice, Adélia, Pessoa, Cecília, Cabral, Bandeira, que me alimentam desde sempre. Ah, da Ana Maria Machado, concluí a leitura de "Infâmia". Mais: "Orestes Barbosa: repórter, cronista e poeta" (aquele de "Chão de Estrelas"), escrita por Carlos Didier, e "Histórias íntimas: sexualidade e erotismo na história do Brasil", de Mary del Priori, também entraram na lista. Música? Assim como a literatura, só o suprassumo: Elis, Ithamara, Buarque, Bach, Chopin, Caymmi, Cartola, Jobim, Lobo, Donato, Dvorák, Hime, Lins, Cavaquinho, Clementina, Armstrong, Holiday, Maysa, Piaf, Tim, Célia, Baker, Vinicius, Menescal, Madi, Coleman, Gillespie, Hancock, Bosco, Callas, Astrud, Flora, Nana, Bethânia, Nara, Sumac, Elizeth, Ney, Alaíde, Áurea, Gata Mansa, Cida, Milton, Djavan, Lee, Ella, Vaughan, Maria Creuza, Paulinho da Viola, Martinho, Dalva, João, Caetano, Elza, Leny, Gal, Gonzaguinha, Dinah Washington, Calcanhotto, Clara, Salmaso, Ozzetti, Simonal, Jussara, Rita Ribeiro, Leila Pinheiro... DVDs? São tantos, meu Deus! "Jules e Jim", "La Strada", "Central do Brasil", "O discreto charme da burguesia", "Sonata de outono"...
           Além de muita literatura, muita música e muito cinema, desejo que, no ano novo, muitas pessoas passem por uma "desintoxicação tecnológica". O número de gente viciada em tecnologia está alarmante. Na TV, há uns dias, ouvi uma pessoa dizer que ela chega a acordar de madrugada para ler mensagens no "twitter". Não consigo entender como uma pessoa pode ficar o tempo todo "conferindo mensagens". Sobra tempo para pegar um livro? Sobra tempo para ouvir música? Sobre tempo para assistir a um filme? Sobra tempo para trabalhar? É óbvio que não! Então, espero que, este ano, as pessoas consigam enxergar que há vida interessante longe de muitas besteiras ditas no "twitter" ou no "face". Cá entre nós: nessa vida de "face" e de "twitter", há muita gente com tempo disponível à beça, não há? Querem um exemplo? Fulano resolve almoçar em um restaurante lá em Conceição de Macabu, por exemplo. Imediatamente, o que a criatura faz? Vai ao "face" e diz aos amigos que "almoçou em um restaurante em Conceição de Macabu". Para piorar, ainda cita item por item do prato escolhido. "Pelamordedeus"! Não aguento isso! É muita falta do que fazer, não é?
          Se quero mais para o novo ano? Quero muito mais! Sempre muito! Para começar, muita saúde. Sem ela, nada vale. Tudo fica desimportante. A doença, como disse/cantou Gonzaguinha, "acaba com a gente deixando esmagada a vida no chão". Até mesmo uma dorzinha de cabeça deixa o dia mais cinza. Haja força de vontade para ficar "de" pé. Haja fé! Portanto, saúde, saúde e mais saúde! O que vier depois, como eu mesmo sempre digo, é sobremesa.
          Mais desejos? Claro! Sempre! Voltando ao assunto das caminhadas, desejo, sinceramente, que as pessoas caminhem mais e façam menos gracinhas. Ah! E que caminhem não só em janeiro, mas durante todos os meses do ano. É... caminhada não é só para mostrar o "corpão" na praia, mas para preservar a saúde física e a mental. Por que eu disse "caminhar mais e fazer menos gracinhas"? Porque, obviamente, a maioria só faz gracinha. Exemplos? Ih! Vários! Outro dia, a certa distância, avistei um rapaz (quase 'senhor') que me confundiu: eu não sabia se ele estava alongando as pernas ou fazendo xixi em algum poste imaginário, tão estranhos eram os tais alongamentos. Meu Deus! Se não sabe "alongar", vá atrás de alguém que ensine, não é?  Até mesmo porque alongamentos errados podem causar graves lesões, dizem os professores de educação física. Mais gracinhas: há umas figuras que passam por mim quase 'se' derretendo. Minutos depois, elas voltam, mas aí não as vejo mais, porque são uma "poça só" (percebo os respingos). O rosto está um fogaréu. Acho bom nem aferir a pressão arterial nessa hora. E aquelas pessoas que parecem uns postes cheios de fios/ligações clandestinas? Incrível! Mas muitas caminham cheias de fios. Tenho até medo de levar um choque, caso esbarrem em mim. E o pior: ouvindo o quê, meu Deus? Nem quero saber. "Jazz" é que não é! Deus me livre! Ah! Não poderiam faltar os que caminham falando ao celular. Que beleeeeeza! Há uns que ainda brigam enquanto falam. E gesticulam muiiiito! Se a caminhada visa também ao relaxamento, por que muita gente insiste em falar ao celular enquanto caminha? Sem resposta...
         Vamos a mais desejos ("trem" que não cessa esse "negócio" de desejo, não é?). Ah, gostaria muito também que aquele povinho que só me vê com um $ na testa (como se eu fosse rico!) se afastasse de vez e por vontade própria. Assim, evitamos as benditas "saias justas". Não é tão difícil ligar o "desconfiômetro", desconfio. Poupe-me de ter de fugir constantemente desse tipo de gente. Fugir ainda é fácil. O pior - e já fiz isso - é pedir que a pessoa "se" mande, "dê no pira". Esse tipo de gente só puxa para baixo. Comigo, só quero pessoas que consigam enxergar minha "aura clara". Para conseguir isso, só quem é clarividente, parafraseando o Gil. Pois que venham, então, os clarividentes, os espíritos elevados, porque os de baixa frequência estão fora de minha relação de amigos. Estão fora de meu terreiro.
           E por falar em amigo, não faz muito tempo, minha saúde apitou (sempre que não 'nos' damos oportunidades para um descanso, a vida, como sempre, trata de impor uma "pausa"). Adivinhe quem me visitou? Adivinhe quem telefonou? Adivinhe quem enviou mensagens? Só os amigos. Os amigos mesmo! Nenhum golpista de plantão apareceu em minha casa. Minto: apareceu, sim, mas para tentar dar, como sempre, golpes e mais golpes. Não é piada! Houve gente que teve a cara de pau de 'me' procurar para fazer um "empréstimo". Fico imaginando o seguinte: quando esse povo faz a barba, o que deve sair de "pó de serra" não é brincadeira. Argh!
            Então, no ano que desponta, só quero boas pessoas por perto. Citando Lya Luft, quero o "coração rodeado de generosas varandas", nas quais só os amigos estarão em minha companhia... para contemplarmos belos horizontes, para contarmos "causos", para jogarmos conversa fora, para celebrarmos a vida, que "é bonita, é bonita e é bonita".  

        você é o que você mente!
Lúcio Manga
quando o ano novo chegou debaixo de uma enorme chuva, achei bom! fosse uma manhã de sol, a praia certamente ganharia da chance de reclusão. a piada poética com os versos de andrade, o oswald, é uma possibilidade para pensar um pouco sobre a própria vida, nesse início de ano. o que está ao nosso redor pode parecer um emaranhado de situações isoladas, mas é preciso perceber que o barco é o mesmo, embora a miséria reme e a riqueza passe o protetor solar para aproveitar a vida. como perceber isso sem sensibilidade? e aí entra o processo de formação. a vida - dentro da teoria de clichês que adoro - acaba logo. basta um olhar no velho álbum de retratos para perceber que não se é o mesmo nunca mais.
para a construção de um olhar mais sensível sobre a realidade ao redor, exige-se a busca dos que conseguem perceber o que não somos capaz (sic) a olhos nus. e é aí que entram o cinema e a literatura. nos bons filmes e nos bons livros, é possível estabelecer uma relação de cumplicidade e de se perceber, afinal, estamos lá, dentro de personagens e de histórias que retratam o nosso perfil psicológico. ler para ver, ou ver para ler é o melhor divã. uma chance para a descoberta pessoal. percebido o broto, se adubado constantemente, brotará uma flor chamada sensibilidade. aposto nessa teoria, na certeza de que criamos mal a ideia de futuro, cercado de grana e amigos inúteis. e me veio isso por agora, porque início de ano é uma chance e tanto. como aquela formulação do: é agora ou nunca. repararam como até essa ideia do agora ou nunca está desaparecendo? o tempo devora as chances todo dia.
como o ser humano é uma constante mentira de ações - e nem adianta negar -, cabe uma fugida da realidade. uma personagem pode dizer o que é preciso ouvir e por não haver compromisso com quem quer que seja ela vai dizer. situações da trama constroem pensamentos e ajudam as portas da percepção. abri-las, um desafio pessoal a cada obra. não há outro lugar melhor para enxergar os próprios erros. não é possível mentir para si mesmo e, se vem um brás cubas ou uma macabeia, por exemplo, e se colocam entre esse hábito de se esconder, o espelho retrovisor futuro sinaliza atalhos, desvios... o mundo particular estabelece uma boa relação com arte. basta o hábito. muitos comprimidos podem ser poupados nessa empreitada. a sensibilidade, penso, constrói-se dentro dessa lógica. e é bom deixar claro que, quando falo de sensibilidade não me refiro à pieguice, mas de um olhar mais humanizado. não se quer a esmola, e sim a chance.
com as inúmeras possibilidades de informação que a internet oferta, não é difícil achar livros e filmes. mas, trouxeste as chaves? a questão é poética mesmo. as chaves são a metamorfose do querer que isso seja o fato. pense bem. não dá mais para percorrer a vida sem ao menos ter lido de verdade os grandes autores ou ter assistido aos grandes filmes. e nem adianta o argumento de que tudo isso é muito intelectual, pois esse papo de intelectualidade está por fora. pensar ultrapassa esses rótulos. a vida pessoal pode ser montada da forma que você quiser. e ninguém precisa saber o que você está lendo ou vendo. a ação é pessoal. a conspiração com o que está dentro do seu psicológico é uma boa chance de sabotar o que até agora, como você mesmo sabe, não serviu para nada. o mundo é tão fútil que fica difícil acreditar nessas palavras. e nem me venham com a ideia de que estou a promover autoajuda, porque o que indico irá justamente desconstruir o que você imagina que seja aí nessa vida comum. as verdades deixarão de estar encobertas e a porrada será certeira. mas não se assuste, se fizer sol, você pode continuar a ir atrás das máscaras que o mundo das possibilidades oferece. acredite, você não será afetado, e vai dar continuidade ao barco da vida que ruma por águas sempre dantes navegadas. afinal, você é o que você mente.
ps. a coluna de hoje é dedicada a piza, o daniel. colunista do estadão que faleceu sem dizer adeus. a ele a promessa de querer mudar o mundo pela leitura.
Fonte: http://gazetaonline.globo.com/_conteudo/2012/01/noticias/a_gazeta/caderno_2_ag/1081092-voce-e-o-que-voce-mente.html

5 comentários:

  1. como é gostoso ler as suas palavras, fazer paradas, sorri e me diverti... ando precisando disso... achei esse blog como quem achou um tesouro, voltarei outras vezes! Hércules Campos.

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    1. Muitíssimo obrigado, Hércules! Fico lisonjeado com suas palavras. Que luxo, rapaz! Para mim, é um honra tê-lo como leitor. Volte sempre! Um abração,

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  2. Muitíssimo obrigado, Hércules! Fico lisonjeado com suas palavras. Que luxo, rapaz! Para mim, é uma honra tê-lo como leitor. Volte sempre! Um abração,

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  3. Fábio, meu amigo, "a moda do consumo" esta tomando conta de tudo: é moda, inclusive, citar trechos de grandes obras ou grandes escritores; mas, pergunte de onde vem os trechos. Não sabem, nem nunca saberão. Para saberem precisam de livros e isso é dispensável. Contudo, não me privo do prazer, por exemplo, de "viver" em Doncovimeproncovô.

    Um grande abraço, meu amigo!

    Rodrigo Davel

    Obs.: "Fico imaginando o seguinte: quando esse povo faz a barba, o que deve sair de "pó de serra" não é brincadeira. Argh!"

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    1. Rodrigo, meu amigo, pior do que a onda da "citação de trechos de obras" é o tal do "autor desconhecido". Misericórdia! Rapaaaazzzz, se eu fosse fútil e vazio como muita gente por aí, eu teria vergonha. Obrigado, meu querido, por "viver" em 'Doncovimeproncovô'. Não me canso de repetir que sua 'presença' por aqui é importantíssima para a permanência do 'blog'. Abraço forte.

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