sexta-feira, 8 de julho de 2011

MUNDO CÃO

                        

                          
MUNDO CÃO
Zeca Baleiro e Sérgio Natureza

ouço seu latido
mundo pequinês
mundo comprimido
um midas por mês

neste grande imenso pet shop
a cultura é um sabão
artigo de fim de estoque
aproveite a ocasião
mundo mundo mundo cão
mundo mundo cão

A EPIDEMIA DA BELEZA

Movidos pela vaidade, pelo menos 130 mil crianças e adolescentes submeteram-se, no ano passado, a operações plásticas.

Essa é a estimativa da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, que, em pesquisa realizada entre seus 4.000 associados, detecta o aumento a cada ano de crianças e adolescentes dispostos a entrar na faca para ficar mais bonitos.

Qual a extensão desse servilismo à estética? A situação é mais grave do que se imagina. Pesquisa quantitativa e qualitativa (conversas em grupo) feita pela MTV sobre o perfil dos jovens brasileiros de 15 a 30 anos de idade, divulgada na quinta-feira, revela uma epidemia de preocupação com a beleza física.

Em parceria com o Datafolha, a MTV perguntou aos entrevistados, por exemplo, se trocariam 25% de inteligência pela mesma proporção de beleza. Resultado: 15% foram francos o suficiente para admitir a troca. Nem se preocuparam com o fato óbvio de que a beleza física passa rapidamente, mas a inteligência fica.

Fiquei me perguntando se os jovens dispostos à troca já não teriam um QI não muito elevado. A julgar pela pesquisa, o problema não está no QI. Trata-se de um mal que afeta parte expressiva de uma geração das classes A, B e C, ou seja, da fatia da sociedade em que se inclui a elite.

O principal resultado desse perfil é ter detectado até que ponto vai a reverência exacerbada à beleza física. Convidados a definir os traços que melhor definem a atual geração, os entrevistados colocaram em primeiro lugar -e bem na frente- a vaidade. Depois, aparecem o consumismo, o individualismo e o comodismo.

Por que está ocorrendo essa "epidemia da beleza"? A resposta é óbvia -e nós, da mídia, somos, em parte, responsáveis por isso.

Há uma supervalorização da aparência. Seres anoréxicos e fúteis, quase inumanos, como Gisele Bündchen, são apresentados como padrão de beleza e de sucesso. A mídia, por sua vez, não se limita a fotografá-los, mas freqüentemente busca suas opiniões sobre os mais diversos temas, de política a transgênicos.

Dissemina-se um culto à celebridade, que dá lugar ao surgimento de uma espécie de casta na sociedade, a casta dos "famosos". E, para ser famoso, não é preciso necessariamente fazer algo de relevante -basta aparecer.

É o domínio da fugacidade. A internet, na sua extraordinária velocidade em tempo real, é a síntese tecnológica da voracidade do presente, do agora.

A pesquisa mostra, de um lado, o narcisismo entre jovens e, de outro, um ceticismo. São as duas faces de uma mesma moeda. Políticos são sempre ruins, independentemente dos partidos. Logo os governos são iguais. Na opinião de 64% dos entrevistados, o governo Lula está igual ou pior do que o de seu antecessor.
O jeito, portanto, é o salve-se-quem-puder. Se não existem utopias -e toda utopia é um pacto com o futuro- nem se acredita na política, sobra apenas a saída individual.
Até porque a mensagem predominante é a do consumismo como fonte de prazer e de realização. Vale perguntar se esse imediatismo não é um estímulo ao consumo de drogas.

As próprias relações pessoais acabam refletindo esse imediatismo individualista. "Ficar" significa namorar sem estabelecer nenhum laço emocional -laços emocionais implicam compromisso. Vale a pena reproduzir consideração dos pesquisadores da empresa Wilma Rocca & Associados, responsável pela análise dos dados do levantamento, sobre o tópico "ficar": "O próprio ficar já está derivando seu sentido para algo mais superficial, onde sentimentos, ainda que momentâneos, já chegam a estar totalmente ausentes". Servis ao ideal da beleza física, pais abrem mão da condição de adultos, como se quisessem prolongar a adolescência. Não querem ser pais de seus filhos, mas amigos. Não cobram, não dão limites, não exigem -assim como, quando eram adolescentes, não queriam cobranças paternas. O pai muito amigo é, porém, um candidato a futuro inimigo do filho. "Os filhos já evidenciam certo desconforto com a ausência da porção pai e o excesso do lado amigo", observam os pesquisadores.

O culto à futilidade é não só um transtorno individual -em que a pessoa passa a viver apenas em função do superficial e do fugaz- mas também um transtorno coletivo.

Em comparação com o levantamento realizado em 1999, houve uma redução do número de jovens dispostos a realizar trabalhos comunitários. Explicável: na lógica do narcisismo, o outro só serve de espelho. Será que essa onda vai diminuir ? Talvez.

Registraram-se, nas conversas da fase qualitativa da pesquisa, sinais de esgotamento decorrentes dessa multiplicidade de estímulos fugazes, sem laços. Começa-se a perceber que tudo, intenso e imediato, resulta em nada.

PS - Em meio a essa cultura da futilidade, tenho visto um movimento de resistência de jovens que, atentos ao que ocorre ao seu redor, estão querendo fazer a diferença. Tenho visto também escolas e educadores colocarem na prática escolar o estímulo à colaboração. Esse deveria ser o padrão de comportamento, não a exceção, numa comunidade civilizada. Podem me chamar de nostálgico, mas, se ser jovem é ficar obcecado pela beleza e viver em regime alimentar ou achar que se comunicar é ficar na frente de um computador, prefiro ser velho. Sou dos que acham que um dos bons prazeres da vida é ouvir, pessoalmente, sem tela nem terminais, conversa de gente falando das dores, delícias e encantamentos das experiências.

Gilberto Dimenstein, Folha de S.Paulo, 08-05-2005

4 comentários:

  1. Caro amigo pense o que vai ser o mundo daqui por meio século com as nanotecnologias...!? A gente já está fora da circulação. Gente/máquina só 50%, vai ser a combinação a favor da máquina.

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  2. Este é o que chamo de "Blogue de Utilidade Pública" -rs.

    Infelizmente, não sei apontar uma solução para a minha geração. Nem sei se a seguinte será melhor ou, talvez, pior. Mas, o que posso fazer para abrir olhinhos, faço.

    Abração, Fábio.

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  3. 000000000b nm nh.;kjtbjmjjjji,,ok dcdcg.

    (este foi um comentário de Sophia)

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  4. José Manuel, "cá estou a pensar" no mundo daqui a uns anos... Jesus!
    Rodrigo, gostei do comentário da Sophia.
    Obrigado, amigos, pela visita.
    Abração, Fábio

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