quinta-feira, 7 de junho de 2012

ITHAMARA KOORAX NO ESPÍRITO SANTO




NEM FOI PRECISO VINHO
Por Fábio Brito
                                                  Deixa subirem os sons agudos, os sons estrídulos do jazz no ar.
Mario Quintana
Dia 2 de junho, em Santa Teresa/ES, nem foi preciso vinho para aquecer a noite fria de outono. A segunda noite do “Festival Internacional de jazz and bossa” teve o privilégio de receber Ithamara Koorax e os músicos Dino Rangel (guitarra), David Feldman (teclados), Haroldo Jobim (bateria) e Rômulo Duarte (baixo).
O espetáculo – um dos mais “calientes” da estrela maior do jazz - teve início com My Favorite Things. De cara, a diva disse a que veio: com sua voz ‘pra’ lá de poderosa, impressionou deveras o público seleto, que, diga-se de passagem, recepcionou-a calorosamente. Na sequência, vieram canções que ela não canta há um bom tempo, como The Shadow of Your Smile, Un Homme et Une Femme e Fica mal com Deus, esta do inesquecível Geraldo Vandré, o lendário compositor de Pra não dizer que não falei de flores (Caminhando). Got to be Real, que dá título ao último CD, assim como várias outras do espetáculo, comprovou a voz rara de Ithamara: seus agudos lancinantes impressionaram a todos. Minha saudade, dos mestres João Gilberto e João Donato, veio logo depois e provou, mais uma vez, que nossa estrela tem um ritmo e uma musicalidade incomparáveis.
 Também plenamente integrada ao roteiro, Aviso aos navegantes (SOS solidão), uma das mais deliciosas canções do repertório de Lulu Santos, ganhou “acompanhamento” do público, que assistia – deslumbrado - ao espetáculo. Um dos momentos mais vibrantes da apresentação (é bom registrar que todos os momentos ficaram irretocáveis) foi quando, em duo com a guitarra de Dino Rangel, Koorax interpretou Bye, Bye Blackbird, uma homenagem pungente a Miles Davis, uma das lendas do jazz. Impossível tentar descrever a beleza do número. Só estando lá. No embalo, foi a vez de Toque de cuíca, que contou com uma performance impressionante: intérprete e músicos deram uma “congelada”, como se estivessem “brincando de estátua”. Maravilhoso! E o que dizer de Never can say Goodbye? Arrebatadora. E "Can't Take my eyes off of you"? Quanto a esta, não foi surpresa para mim ouvir o público, em coro, cantar o refrão. A sensualidade que Ithamara conseguiu imprimir à conhecida canção é algo dificílimo: é quase impossível alguém fazer melhor. Só verdadeiros intérpretes conseguem isso. O comum, quando se tem uma canção conhecida, é encontrarmos cantores que apenas repetem interpretações. Ithamara não: ela vai sempre além e surpreende. E o que dizer também de Mas que nada, clássico de Jorge Ben (ele ainda não era Benjor)? Assim como todas as canções que interpreta, esse clássico é o mesmo que já ouvi em outros “shows” e, no entanto, a cada interpretação, é sempre uma nova música. Isso é fantástico, porque Ithamara, intérprete rara, nunca repete uma interpretação. Pois é, depois dessa canção, ninguém queria que o ‘show’ terminasse. E não terminou. No bis, acompanhada de David Feldman, ela volta para uma despedida arrebatadora em um improviso a que só os gênios têm direito. De pé, o público não queria parar de aplaudir. E olhe que há uns e outros que ainda dizem que Ithamara é elitista. Findo o espetáculo, tive vontade de ajoelhar-me e agradecer por tanta beleza.
  Espetáculos como esse de Santa Teresa só comprovam, mais uma vez, que o talento de Ithamara é incomum. Não faltam elogios a essa intérprete respeitadíssima em todo o mundo. Entretanto, não custa nada reforçar que sua extensão privilegiada, seu timbre lindo, sua incomparável divisão, seu ritmo e sua musicalidade fazem dela a primeira dama da música no mundo, lugar que ela ocupa indisputavelmente desde que, há vinte anos, começou a carreira, abençoada por ninguém mais, ninguém menos que a “divina” Elizeth Cardoso, sua madrinha.   
   É, para nós, um privilégio termos uma intérprete como Ithamara. Dá um orgulho danado! E esse orgulho aumenta ainda mais quando constatamos que nossa diva não precisa de "acrobacias" para estar no palco. Ela precisa dA voz. E que voz! No entanto, ainda há espaços aqui no Brasil, como os SESCs “da vida”, por exemplo, que a catalogam de elitista e, portanto, não a contratam. Assim, privam muitas pessoas do talento fora do comum dessa artista. Por que isso? Porque, infelizmente, vivemos em um país que idolatra o que há de pior em termos de arte, e o resultado, que não poderia ser diferente, é a péssima qualidade, principalmente na música, que prolifera por aí. Via mídia, quem são os incensados? Obviamente, os que fazem de seus espetáculos meras aulas de aeróbica, das quais muitos de nós precisamos, mas em academia, é claro! Em se tratando de música, precisamos da voz e de músicos competentes, como o são os que acompanham Ithamara. Sem as tais "acrobacias", muitos artistas desapareceriam, porque só entendem de pulos e gritinhos no palco. Perdão! Entendem de mais algumas “coisinhas”: precisam, para os “shows”, do modelito exclusivo do estilista tal, além de outros apetrechos. Tudo bem. Nada contra o modelito ou outros apetrechos, mas tudo contra quando o que existe é apenas isso. Ithamara está além de ostentações e futilidades. Em seus “shows”, o que vemos é pura Arte. 
P.S.:
Acabo de saber que o CD Got to be real, o mais recente da Ithamara, já é o mais executado na Europa. Pois é, enquanto os SESCs fecham-lhe as portas, o mundo a idolatra. Vai entender...
  
 






9 comentários:

  1. Sou testemunha da primeira apresentação de Ithamara no ES simplesmente arrebatadora. Vale lembrar que estava em companhia de pessoas muito especiais e amigas: Fábio Brito e Adrine Fin.

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    1. Pois é, Fê, o "show" foi maravilhoso mesmo! Que dia inesquecível! Beijos.

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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  3. Eu não a conhecia antes da apresentação em Santa Teresa, foi muito lindo! Amei o texto também.

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    1. Obrigado, Nayara, pela visita ao "blog". Sobre o "show" da Ithamara: foi lindo à beça! Adoro essa cantora! Um beijo.

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  4. Infelizmente, perdi essa!
    O que faço, amigo? Jogo-me da 'Ponte-de-Ferro?
    Mas, não precisava estar lá para confirmar e assinar em baixo em tudo o que relata, meu amigo! Como já tive o prazer de assistir a uma show dessa diva, e ouvir frequentemente os CD's que ganhei da própria, sei que é uma obra de arte em movimento e voz no palco!

    Abração,
    Rodrigo Davel

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    1. Pois é, Rodrigo, você perdeu. Foi um "show" e tanto.
      Por enquanto, não carece de 'se' jogar da ponte. Haverá outros 'shows'.
      Abração.

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  5. Fábio, ler o seu texto sobre a Ithamara despertou em mim o desejo de conhecê-la, de ir a um show dela (e que show deve ser hein?)... ouvi-la, ainda que pelo vídeo postado é de fato magnífico... há algo ímpar na voz dessa criatura, que mexe com as entranhas da gente né??? Me deu uma saudade de tanta gente... viajei no tempo... obrigado por isso!!
    Beijo na alma!!
    Hércules Campos

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  6. Hércules, meu querido, fico muito feliz em saber que meu texto despertou em você o desejo de ir a um "show" da Ithamara. Vamos?! A voz é fantástica mesmo! É "a" voz, como sempre digo. Um beijo e muitíssimo obrigado.

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