VALSA DA ILUSÃO
Zé Manoel
Junto ao luar,
Você sorrindo diz:
- Me dê a mão,
Vou te levar comigo pro salão,
Vamos dançar a valsa da ilusão.
Seus olhos fitam meus olhos
E a nossa boca se faz em festa
E pelos ares flutuando
Nossa linda valsa nas cordas da orquestra.
Quem sabe, amor,
Se essa música jamais findasse,
Eu não iria mais sentir saudade
De ter você aqui bem junto a mim.
E se eu disser
Que nunca mais serei feliz sozinho?
O meu caminho vai ser seu caminho
E encontraremos a felicidade.
E quando o sol
Apareceu no céu, foi tão cruel!
Eu acordei de braços com o papel,
Eu quis compor uma canção pra nós.
Meu coração guardou essa melodia...
Ai, doce ilusão, você comigo algum dia.
A
BOA MÚSICA CONTRA A FAROFADA
Por
Fábio Brito
Há
dias, assistindo a vídeos no YouTube, que é o que há de melhor neste mundo
virtual em que estamos imersos (a maioria das pessoas está setenta e sete mil
vezes mais imersa do que eu!), dei de cara (ou “dei de ouvidos”) com o Zé Manoel, um
músico pernambucano extremamente talentoso e de quem eu já ouvira falar. Ao
constatar o talento desse rapaz, que segue a melhor trilha da MPB, aquela aberta
por músicos como Tom Jobim, Dori Caymmi e Edu Lobo (só para citar alguns), pensei,
imediatamente, na diversidade da música brasileira e no quanto ela anda
sufocada pela indústria, para a qual o que tem qualidade não interessa. Desnecessário
dizer que Arte não tem o mínimo valor para essa indústria perversa.
Para
essa indústria de que falo, que só enxerga cifrões e mais cifrões, a aposta é
na mediocridade. Não tenho quaisquer dúvidas quanto a isso. O que vemos é um
grupinho de medíocres decidindo o que o Brasil vai ouvir. Só não vê quem não
quer. Assim, o que se produz - e aos borbotões - é "cantor de laboratório". Tentem, por exemplo, assistir a algum programa – de auditório, por exemplo – transmitido pelas grandes redes de TV (ou “redezonas”, para
alguns) e confira o que estou dizendo. O que é apresentado como “música” nesses
programinhas inclassificáveis é assustador. A TV, como sabemos, é gerida pelo
dinheiro, pela indústria. Dessa forma, jogam o que há de pior sobre o telespectador,
cuja maioria, infelizmente, só está a fim de “diversão barata” (foi bem
adestrada para isso). O “jabaculê” (ou “jabá”, para os mais íntimos) saiu do
rádio faz tempo e foi para a TV. O resultado não poderia, obviamente, ser pior:
de um lado, músicos geniais vivem clandestinamente (ou “acampados”, para usar
uma expressão cravada por Nana Caymmi) neste país e passam por inúmeras
dificuldades (financeiras, principalmente); de outro, o que há de pior vem à
tona: a mediocridade triunfa... e os "gênios incensados" pela máquina de produzir cantores compram fazendas e carrões e garantem seu futuro financeiro.
Se
os programas de auditório só mostram o que há de pior (deve haver exceções, que
desconheço, entre esses programas), o que diríamos, então, dos que são
catalogados como “programas musicais”? Eu diria que esses programas estão emparelhados com os demais: são medíocres também. Simples assim. Outro dia, na TV, um produtor musical respeitadíssimo disse que, hoje, seguindo os padrões impostos pelos programas musicais que estão aí, Nara Leão e Chico Buarque, por exemplo, não existiriam. Com seu canto minimalista, essa
dupla, que ajudou a mudar a história da MPB, estaria bem longe desses programas.
O padrão de canto “estadunidense para vender”, como digo, é o que prepondera em
tais atrações. As moças, por exemplo, têm de copiar cantoras que fazem sucesso somente porque gritam. Difundiu-se
a ideia de que, para cantar bem, o candidato precisa gritar. Quando sai um
grito, que nunca é afinado, o auditório vibra, delira. Quer gritar? Grite, mas tem de gritar afinado. Cá entre nós: copiar modelo,
seja de onde for, é prova de uma subserviência de dar dó... Em Arte, autenticidade
é tudo. Ou não é?
Pois
é, a despeito de “programas musicais” (e de tantos outros) que nos são “oferecidos”,
a revolução musical em nosso país, capitaneada por músicos do calibre do Zé
Manoel, já existe, mas não está sendo televisionada. O que as “grandes
redes” de TV apresentam, volto a frisar, não é “a” música brasileira, mas o que
há de pior: gente inclassificável, que faz uma “musiquinha” ainda mais
inclassificável (se ainda for possível descer mais), que é consumida por muita
gente que nem sabe o que está consumindo. Nesse cenário, o que constatamos é
que essas “grandes redes” de TV prestam um enorme desserviço, um imenso desfavor à cultura deste
país. O que precisa existir – e já! – é uma política cultural de exportação de
nossa melhor Música, como afirmam alguns especialistas nesse assunto. Enquanto
essa política não existir, pessoas talentosíssimas continuarão ilhadas (ou “acampadas”),
apresentando-se em espaços que, a despeito da falta de divulgação, ainda existem. No Rio de Janeiro, por exemplo, de uns anos “pra” cá, várias casas que abrigavam
o que há de melhor em Música fecharam suas portas. E aí? E aí... o aeroporto
pode ser a melhor saída para quem tem talento e não quer morrer de forme nesta “terra
papagalli”. Só isso!
Em tempo: certa vez, Elis Regina disse que ela fazia parte de uma geração que fez a feijoada na Música Popular Brasileira. Depois, veio muita feira. Fico imaginando o que a "Pimentinha" diria hoje, quando assistimos à produção intermitente de tanto lixo musical.
Em tempo: certa vez, Elis Regina disse que ela fazia parte de uma geração que fez a feijoada na Música Popular Brasileira. Depois, veio muita feira. Fico imaginando o que a "Pimentinha" diria hoje, quando assistimos à produção intermitente de tanto lixo musical.
INDÚSTRIA
CULTURAL
Na virada do
século XIX para o século XX, o mundo ocidental conheceu uma nova forma de
produção cultural. O método de produção em larga escala, difundido por Henry
Ford, começou a se estender. Os avanços tecnológicos possibilitaram o
surgimento de novas formas de expressões artísticas e o estabelecimento de
novas relações entre o público e a arte.
O cinema, por
exemplo, é uma dessas expressões. A gravação de determinada sequência de cenas
pode ser copiada e o filme pode ser visto por diversas pessoas em diversos
lugares do mundo. É certo que essa possibilidade de alcançar muitas pessoas é
boa. Porém, alguns filósofos perceberam que havia algo não tão positivo nessa
nova realidade. Os filósofos alemães Max Horkheimer (1895-1973) e Theodor
Adorno (1903-1969), observando esse novo momento do fazer artístico, cunharam o
termo “indústria cultural”.
Indústria
cultural é o termo usado para designar esse modo de fazer cultura a partir (sic) da
lógica da produção industrial. Significa que se passou a produzir arte com a
finalidade do lucro. Para se obter lucro com o cinema, por exemplo, é preciso
fazer um filme que agrade o (sic) maior número de pessoas. Dessa forma, criam-se
alguns padrões, como o vilão e o mocinho, as histórias de amor, os finais
felizes. No fundo, toda a produção artística fica padronizada e não há espaço
para o novo.
Todo esse
processo de padronização ocorre também no universo da música. Um ritmo ou
artista de sucesso logo é “copiado”, não possibilitando aos ouvintes a escolha,
já que é tudo muito parecido. Outro problema é que não há mais espaço para a
liberdade de criação. No caso da música, a composição precisa estar de acordo
com o produtor musical, com o empresário, com o dono da gravadora. No fundo, a
lógica da produção artística é a mesma da produção industrial, onde cada um
“aperta um parafuso” sem conhecer todo o processo. O importante é sempre vender
muitos álbuns, não importando muito a qualidade musical.
Essa indústria
da cultura, produzindo essa cultura para as massas, faz com que se entre num círculo
vicioso. A indústria define qual tipo de arte pode ser consumido; e parte do
público que não se rebelou com os padrões impostos passa a perder a sua
capacidade de julgar e de perceber algo bom. Com isso, a indústria cultural
passa a produzir mais arte de péssima qualidade e o público consome essa arte.
Disso resulta arte sempre com qualidade inferior e público sempre com gosto
inferior.
Entretanto, do
mesmo grupo de amigos de Adorno e Horkheimer, o filósofo Walter Benjamin
(1892-1940) via algo bom no fato de essa arte alcançar diversas pessoas. Para
Benjamin, há uma democratização da arte. A possibilidade de copiar o que se
produz é a possibilidade de levar cultura para um maior número de pessoas. A
fotografia possibilita que se observe um quadro de um museu distante, sem a
necessidade de o observador ter de se deslocar. O cinema possibilita o mesmo.
Mesmo a fotografia e o cinema sendo um fragmento do olhar de quem estava por
trás da câmera, é possível levar esse pedaço do mundo para outras pessoas.
Além disso,
com o avanço tecnológico, é possível que mais pessoas tenham acesso às
ferramentas para a produção cultural. Benjamin não viu o mundo tecnológico que
temos hoje, mas o que ele pensou pode ser observado. O barateamento da
tecnologia permitiu que muitos artistas gravassem em estúdios improvisados nas
suas garagens e quartos. O computador é uma dessas ferramentas que possibilitam
uma abertura para o mundo, democratizando o acesso à cultura.
Filipe Rangel Celeti
(http://mundoeducacao.bol.uol.com.br/filosofia/industria-cultural.htm)
(http://mundoeducacao.bol.uol.com.br/filosofia/industria-cultural.htm)
E quando colocam "jurados" com gosto musical duvidoso... para "julgar" não-cantores que resolveram se arriscar na música... e... tais jurados... acabam falando só batatadas!!!
ResponderExcluirÉ, Fernando, é terrível isso. Como alguém pode julgar algo sem saber fazer o que julga? Não entendo. Não entendo mesmo!
ExcluirInversão de valores... os que sabem cantar e tem repertório invejável... quase ninguém ouviu falar!!!
ResponderExcluirOs que arrastam multidões... mas, tem músicas de qualidade duvidosa... fazem um sucesso tremendo!!!
Inversão total, Fernando. Cantores/intérpretes extraordinários não conseguem espaço, não conseguem gravar... Beijos e obrigado pela visita ao blogue.
ExcluirNão há como discordar de você, como sempre...e que, mais uma vez, dá um banho de lucidez, cultura , conhecimento e bom gosto usando de assertividade , brilhantismo e irretocabilidade na justa medida. Adorei, querido amigo. Lavou a alma.Também incontestáveis o Horkheimer e o Adorno, evidentemente.
ResponderExcluirCada um ouve ou gosta daquilo que merece ou do que tem potencial...afinal, gosto também é qualificação ...e não se discute, lamenta-se. Há décadas estou querendo (o impossível) , debalde, ouvir um funk carioca proibidão, p.ex., que seja admirável, com belas harmonias e letras poéticas/inspiradas. Desnecessário dizer que música, para mim, tem de ter ótima qualidade. Meu ouvido não é penico rs.
Claro que somos a música que ouvimos, pois ela revela o que vai na nossa alma e/ou psiquismo.SE OS ESTUPROS SONOROS ...as bagaceiras rs insuportáveis e apelativas... essas insuportáveis tranqueiras possuem valoração...desconheço e não tive a honra de ouvir/perceber. Dá para evoluir ouvindo porcarias?
Na Antiguidade, Platão JÁ dizia que a BELA música possuía uma função catártica, de purificação. Colocava o corpo em equilíbrio, harmonizando-o com a ordem cósmica, preparando-o para a aparição do divino. Conceitualmente posso concluir que o funk carioca proibidão e seu barulho infernal...prepara ‘o espírito possuído”para a aparição do demoníaco, evidentemente.
A música , segundo ele, pleno de razão... imitaria os estados de alma, suas emoções e virtudes. O funk e estes lixos sonoros desnudam, então, a alma dos seus fanáticos adoradores...que possuem as mesmas "qualidades funkeiras" ...por afinidades eletivas. Platão conclui, brilhantemente com o que considero de evidência solar. A música atua sobre as almas não pelo viés da empatia, mas de uma maneira subconsciente. Coloca em cena um novo tipo de influência, perigosamente eficaz. Porque nada mergulha mais fundo no cerne da alma do que os ritmos e as harmonias. Em um de seus últimos escritos,’ As Leis”, o filósofo afirma que os cantos e as danças permitem acalmar os desequilíbrios emocionais, ensinam a dominar as manifestações somáticas dos afetos e das paixões.
De todas as artes, a música é, sem dúvida, aquela cujos efeitos são os mais profundos e insidiosos.
REPITO: SOMOS A MÚSICA QUE OUVIMOS, ou seja, ela nos revela, lê nossa alma, pois se ouvimos músicas escrotas, escrotos somos. Se, p.ex., ouvimos , e gostamos, igualmente, tanto de chorinho quanto de funk carioca proibidão, somos , no mínimo, promíscuos e sem o menor senso de criticidade, de reflexão ...ou esquizofrênicos ( confusão mental, idéias e percepções desorganizadas ou desconexas), mesmo que ainda não diagnosticados rs.
Beijaços
Desculpe...esqueci de apagar a repetição "essas insuportáveis tranqueiras",
ExcluirMarcos, meu querido, banho de lucidez é você quem dá, meu amigo. Impossível discordar disto: "Somos a música que ouvimos". Perfeito! Às vezes, quando algum desatento vê meus discos e resolve comentar algo como "deve ter de tudo aí", vou logo corrigindo e afirmando que NÃO! Não dá para misturar: ou temos BOM GOSTO... ou temos MAU GOSTO. Se ouço Tom Jobim, por exemplo, é impossível que eu possa gostar desses gêneros inclassificáveis que ouvimos por aí. Muito obrigado, meu querido, pelas referências a Platão. Obrigado pela presença - sempre nobre - aqui neste blogue. Obrigado pela presença - sempre luminosa - em minha vida. Beijos, beijos.
ExcluirMeu caro e admirado/admirável mestre. Você nem imagina a alegria que sinto ao ler palavras tão carinhosas , generosas e luminosas, meu querido amigo. É bom sabermos - os que já estamos em idade provecta, como no meu caso rs - que não somos, ainda, dementes. Melhor, ainda, é receber elogios sinceros e calorosos de quem tanto admiramos e elogiamos. Continuo seu fã e torço pelos seus melhores resultados em todos os âmbitos da sua existência . Saúde. sorte e luz! Beijaços.
ResponderExcluirQuerido Marcos, a alegria é minha. É ótimo tê-lo sempre presente. Mil beijos. Obrigado.
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