sexta-feira, 10 de junho de 2011

O UNICÓRNIO PODE ESTAR NO JARDIM

O moleque aí da foto sou eu... aos 8 anos. Lembrei-me de Casimiro de Abreu. Detalhe: eu já sabia que seria professor. Acho que, até hoje, não fiz feio.


           O UNICÓRNIO PODE ESTAR NO JARDIM
           Por Fábio Brito

Estou ‘careca’ de dizer: a escola não precisa de bons computadores, mas de bons professores. Sei que, com esse tipo de declaração – que volta e meia atrevo-me a dar - vai chover pedrada. Não há problema. ‘Que’ venham as pedras! Há tempos reforcei meu guarda-chuva (ou seria “guarda-pedra”?).
Pois é, faz um tempão que tenho ouvido por aí um discurso para lá de rançoso, bolorento e que me causa certo fastio: “a escola precisa acompanhar a evolução tecnológica. Caso contrário, ‘perderá o bonde da história’. Ela tem de estar atualizada (leia-se: equipada com computadores de última geração)”. Haja espaço para esse discurso mais que mofado! Argh!
Decididamente, não acredito em mudanças desse tipo. De que adianta ser expert em tecnologia, mas não ter a mínima competência para uma educação de qualidade? Para mim, grandes mudanças na educação ocorrerão se o professor for competente. Caso contrário, o que chamam de avanço em educação não passará (não passa!) de mera fachada, de engodo mesmo. Podem argumentar que o investimento em educação tem aumentado, que “isso”, que “aquilo”. Tudo bem. Sabemos que investir nos professores é fundamental. No entanto, o resultado desse investimento tem de aparecer. O resultado tem, necessariamente, de desaguar na aprendizagem do aluno, no resultado que ele apresentar. No entanto, o que vimos por aí, infelizmente, é um pessoal malpreparado (e malvisto), sem o mínimo de bagagem para estar em sala de aula e sem a mínima competência para trabalhar com esse “negócio” chamado educação.
Como medir, então, o preparo (ou o despreparo) do professor? Isso é mensurável? Claro que é! Só para começar, há umas perguntinhas básicas que nos dão informações valiosas. Por exemplo: - Professor, quantos livros você leu no último mês? Pelo menos um? A quantas peças de teatro você assistiu nos últimos seis meses? A pelo menos uma? Quantos CDs você ouviu no último mês? Um? Quantos filmes você viu no último mês? Quantos jornais e revistas você costuma ler durante a semana? Sei que, para a maioria, não deve ser fácil responder a quaisquer dessas perguntas, embora elas sejam bem simples. Ou melhor: deve ser fácil sim. Se muitos forem sinceros, há muita gente que nunca leu um livro, que nunca assistiu a uma peça, que nunca viu um filme, que não lê jornais ou revistas... Xiiii! Ah! O desespero não para por aí: vão aparecer outras desculpas, como “a falta de tempo”, que é e-t-e-r-n-a. Tempo, como sempre digo, é questão de prioridade. O que não for prioritário não entra em minha escala, ok? Algum problema?
 Pois é, há algo de podre no “reino da educação”. A situação não pode, simplesmente, ser essa. Trabalhar com educação exige – ou deveria exigir – acesso constante a bens culturais. No entanto, para a maioria, isso é visto como luxo (quando não dizem frescura e ainda ironizam). Nem vou comentar a velha história da “falta de dinheiro”. Por quê?! Porque ele, o dinheiro, não falta para muita coisa, principalmente para as mais fúteis. Entretanto, falta para livro, falta para filme, falta para peça de teatro, falta para música. Não falta, por exemplo, para a roupinha de marca com que a criatura exibirá a “fina estampa” (muito fina!) nas festinhas. Preciso dizer mais? Estamos entendidos? Fui claro?
Talvez boa parte da culpa (sem medo de usar tal palavra) pelo estado em que se encontra a educação neste país deva ir para a conta da velha história – ideia mais do que disseminada - de que ser professor é algo messiânico. Sem essa! Vocação para messias? Decididamente não tenho. Sempre que ameacei andar sobre as águas, o camisolão saiu molhado. Aposentei essa ideia bem cedo. Querem mais variações sobre o mesmo tema? “Ser professor é um sacerdócio”. Oooooh! Sem essa “coisa” pesadona de sacerdócio! Que sacerdócio o quê? Professor é, sim, profissão nobre, venerável e superior e, por isso mesmo, exatamente por isso, precisa ser bem remunerada. Mas não se trata, aqui, de remunerar bem gente incompetente. Aliás, gente incompetente nem deveria estar trabalhando. Deveria, sim, tornar-se competente primeiro. Ou melhor: deveria descobrir a vocação, que todos têm... ou não? Quem sabe muitas pessoas que, hoje, estão na educação não estariam bem melhor, e felizes, em outras áreas? Basta descobrir o “cantinho” e ser feliz “nele”. O unicórnio pode estar no jardim dessas pessoas. Entretanto, muita gente não consegue enxergá-lo.
Acho deprimente procurar a educação como refúgio, como cemitério de elefantes, como última opção depois de fracassar em concursos e mais concursos. Não é por aí o caminho. Não é pedir muito que, em quaisquer profissões, as pessoas tenham preparo, competência e dedicação... e talento.
E por falar em preparo, ouço, frequentemente, pessoas dizerem que têm participado de muitos cursos, que a escola tem investido bastante nisso, que o município e o Estado têm investido naquilo e mais um monte de chorumelas. No mesmo instante, olho com “o rabo dos olhos”. Cursos?! Que cursos? Esses que não medem nada? Esses que não avaliam as pessoas nem antes, nem durante e muito menos depois? Esses de que muita gente sempre “dá um jeitinho” de fugir? Poupem-me desse tipo de “atualização”. Se é só para ter mais um diploma a contar pontos para provas e mais provas de títulos, melhor nem fazer esses tais cursos.
        O que vimos, então, nesse cenário deprimente, é gente frustrada, revoltada e com uma má vontade imensurável. É gente amarga à beça ocupando algum espaço na educação. Deus me livre!

10 comentários:

  1. Concordo!
    Sempre defendi que a educação é o que muda a realidade de um povo. Quando se fala em vilência, ouve-se também dizerem que vão aumentar o efetivo policial, construir mais e mais presídios e por aí vai. Não se vê ninguém dizer que para acabar com violência, ao invés de fazerem essa baboseira toda, deveriam construir sim boas escolas e preparar bons professores. A pessoa quando tem acesso a educação a mente se abre. A pessoa quando tem um professor que pensa e te convida a pensar junto te faz crescer, até espiritualmente, inclusive. Toda grande mudança começa com a educação, pelo menos é assim que vejo. No mais, um excelente texto, como sempre!!
    Abraços!!

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  2. Concordo plenamente meu caro, no entanto é no meio que está a virtude. Em Portugal depois de uma acesa polémica entre a docência e o governo passou a haver uma regra: a avaliação contínua dos professores. Na minha modesta opinião a avaliação não chega, há que progredir nas emergentes ciências e tecnologias, cada vez mais rápidas. É claro que um professor deve ter cultura e experiência de vida e, essencialmente, gostar "amar" o seu exercício. Quanto ao acordo ortográfico, em Portugal, só entra em vigor, legal, em Janeiro de 2013 e, porque não concordo com ele na totalidade, só começarei e escrever de acordo quando a Lei me obrigar. Veremos a opinião do novo governo, e d@ nov@ ministr@ da cultura, que me parece ser contra.
    Um GRANDE ABRAÇO.

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  3. Fábio, querido Mestre, como é bom "revê-lo"!
    Já comentando uma parte do texto… Este também é o mal das últimas décadas, aonde "ter estrutura vale mais do que pessoas competentes". Sei o que é isso, cansei de ouvir que para realizar bons trabalhos precisava de uma fortuna com equipamentos. O que mais têm é gente dizendo…

    E aquele vinho da qual fui convidado há 3 anos atrás, ainda está de pé? Seu presente, safra de 2006, continua reservado.
    Um grande abraço.
    Zon.

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  4. Você era um fofo! Era não, é. Quis dizer que você está uma criança linda na foto. Curioso: eu não tenho nenhuma dessas fotos de escola, e sequer suspeitava que iria me tornar professora. Beijos!

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  5. Este comentário foi removido pelo autor.

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  6. Este texto mostra claramente que palavras não são somente palavras.
    Que a verdade se mostra na emoção de um grande escritor.
    Parabéns!

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  7. Obrigado, Waguinho, José Manuel, Zon, Mariana e Diândria, pelas palavras carinhosas. A visita de vocês é um luxo.
    Beijão,
    Fábio

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  8. Me fez lembrar a reportagem de hoje no jornal ES TV primeira edição, onde uma escola do interior do estado (do tamanho da minha cozinha) tirou a melhor media de qualidade de ensino do estado. Nessa escola há uma professora que leciona a 31 anos e que ensina para crianças da primeira a quarta na mesma sala. Ela faz a diferença.
    Abração
    Rondi

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  9. "O que vimos, então, nesse cenário deprimente, é gente frustrada, revoltada e com uma má vontade imensurável. É gente amarga à beça ocupando algum espaço na educação. Deus me livre!"

    É, Fábio,
    para jovens como eu que pretendem ingressar nesta área, a educação, é desestimulante saber disso. Não somente por suas palavras; é visível e disseminada essa ideia, ou esse fato. Mas, sabe o que ainda me motiva e me impulsiona a ser o profissional competente e "venerável e superior"? Profissionais que já estão nesse patamar; o senhor, por exemplo.

    Um grande abraço, amigo.

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  10. Obrigado, Rondi e Rodrigo, pela presença constante.
    Gosto muito da opinião de vocês.
    Abração, Fábio

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