quinta-feira, 21 de abril de 2011

TARDANÇA

Fábio Brito

Certa vez, ouvi isto: “Espera-se muito neste país”. Espera-se mesmo! Por tudo e em todos os lugares. E quem espera fica, não raro, aborrecido, não é mesmo? Aborrecido é pouco. Há pessoas que vão além do aborrecimento: chegam às brigas, aos xingamentos, às gritarias. Sem razão? Talvez não.
Já repararam, por exemplo, que, quando algo (ou alguém) entra no circuito do consumo, o tempo de espera aumenta consideravelmente? Nessa lista, estão restaurantes, lojas e até profissionais de saúde, como médicos. É... os médicos, de uns tempos ‘pra’ cá, também fazem parte disso que classifico como “circuito do consumo”. Quando eles estão “na moda”, agendar uma consulta é tarefa das mais difíceis. Só com muita (mas muita mesmo!) antecedência. Porque estão “na moda”, para consultá-los, as pessoas suportam esperar uma encarnação.  
Restaurante também não fica de fora desse rolo. Nos grandes centros, principalmente, se algum deles ‘cair nas graças’ do povo que se diz chique, cuidado! Haverá filas. Se, em determinados dias, todas as mesas estiverem ocupadas, há pessoas que, mesmo assim, suportarão esperar um bom tempo até que alguma seja desocupada. Nada chique isso, não? Muitos não pensam assim. E ficam lá, na fila, com cara de nada e fazendo vento.
Pior do que esperar o dia da consulta ou a mesa no restaurante talvez seja esperar a boa vontade das pessoas que prestarão o serviço a quem espera. O constrangimento, que deveria ser de quem faz alguém esperar, acaba sendo de quem será atendido. No entanto, há lados delicados – e pouco compreendidos - que envolvem essa questão da espera em certos lugares. Em algumas repartições, por exemplo, a culpa (chamemos assim) pela espera não deveria ser atribuída ao funcionário/atendente, mas à instituição. Difícil entender isso? Não! Basta comparar o número de pessoas que atendem com o das que precisam ser atendidas. É brincadeira!
A situação se complica, então, quando, nesse tipo de situação, a ira dos que esperam (e não lhes tiro a razão) recai sobre o atendente, que, em muitos casos, também é vítima (só não o é quando faz ‘corpo mole’ e finge que trabalha). Vítima de quê? Simples também. De um sistema que visa tão-somente ao lucro, em detrimento, é claro, da paciência e da saúde alheias. Ninguém merece (ninguém mesmo!) ser atendido em instituições que deveriam ter, no mínimo, o dobro do número de empregados que têm.
Nossa tradição judaico-cristã nos ensinou a paciência... porque dos pacientes será o céu. Que céu? O dos conformados, é óbvio! O dos que não gritam e reivindicam seus direitos. Desconfio de que o que chamam de paciência é, aqui, sinônimo de resignação e apatia. Muita ‘coisa’ torta reina e impera por aí porque é com os conformados que se constroem mundos. E não são mundos de heróis, mas de gente passiva (não confundir com pacífica) e alienada. E gente passiva, como sabemos, acostuma-se a tudo, principalmente a viver em um mundo errado. Pior de tudo: acostuma-se a achar que o errado é o certo e vice-versa (sem maniqueísmo!). Não grita, não protesta. Resigna-se. Protestemos, então, mas...

Cá entre nós: e por falar em protesto, continuo rezando pela cartilha de Cazuza, nosso talentoso poeta, que, em parceria com Laura Finochiaro, presenteou-nos com “Tudo é amor”: “(...) Mesmo se for pra transformar / Num inferno um céu conformista / Mesmo se for pra guerrear / Escolha as armas mais bonitas (...)”. Pois é, é vital que não nos conformemos, mas com delicadeza, com fineza, com ‘armas bonitas’.
Não há como negar: esperar é um desrespeito. Esperar sentindo dor, então, é desesperador. A revolta, a raiva, os gritos... tudo é mais do que aceitável quando há dor envolvida. Neste instante mesmo, num pronto-socorro de hospital, escuto os brados de uma moça, grávida, que espera há muitas horas para ser atendida. Desrespeito é pouco!
Quando esperamos, alguma vantagem, mesmo que remota, deve existir, não deve? Agora, por exemplo, enquanto espero que todo o líquido de um frasco de soro que minha mãe toma chegue ao fim, escrevo este texto. Pelo menos por isso (e só por isso!) está valendo o tempo de espera. Talvez não, pois estou com fome. Muita fome!  

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