quinta-feira, 21 de abril de 2011

NARCISO É FICHINHA


           Fábio Brito

          Não sei se alguém já “se” perguntou isto: o que mais motiva as pessoas a aceitarem convites para festas? Acertou “na mosca”, só para usar uma expressão bem antiga, quem respondeu “necessidade incontrolável de aparecer”. É... de uns tempos para cá, muita gente anda ‘se’ matando por aí só para “ficar bem na foto”.  E de onde será que vem essa febre intermitente? Do valor exagerado que se dá às futilidades, às banalidades.  
          Pois é, essa necessidade (!), em pleno século XXI, que muita gente tem de ser vista, admirada, “gostada” é algo que assusta um pouco. Excede, extrapola. Vivemos em tempos de culto exacerbado da imagem, da aparência. Não tenho dúvidas quanto a isso.  Alguém as tem?
          Já observaram, por exemplo, aquela olhadela que muitos dão quando passam por um carro estacionado? Que “espelho” irresistível, não?! E aqueles que, entretidos com o espelho dentro do carro, esquecem a luz verde do semáforo? E tome buzinada! E os que andam como se tivessem um espelho à sua frente? Nada mais existe! Somente eles... e o espelho imaginário. Há também os “fortinhos” de academia, que mal conseguem (quando conseguem!) baixar os braços. Não dá para não recorrer àquela velha imagem das rãs. Umas rãs “bombadinhas”, diga-se de passagem. 
          E por falar em imagem, inevitável não lembrar o mito de ‘Narciso’. Grosso modo, Narciso cai nas águas em que se olha com um prazer imensurável. Vale ressaltar que são bem comuns leituras/interpretações desse mito (e da flor) que o elegem como emblema da vaidade, do egocentrismo. Só precisamos ter cuidado com algum tom moralizante que pode nascer dessas leituras.  
          Ranço moralizante à parte, o que me interessa, agora, é a solidão de Narciso. No poema “Narcisse parle” (“Narciso fala”), de 1891, o poeta Paul Valéry nos aponta a “inutilidade” que há no fato de Narciso amar “exageradamente a si mesmo”. Ele contempla com prazer o reflexo de seu corpo, mas é sozinho e chora por isso.
          E é numa grande solidão que percebo muitas pessoas vivendo hoje. É provável que a solidão de que ‘padece’ Narciso esteja bem mais presente do que imaginamos. Talvez seja a tão decantada solidão do homem moderno (ou pós-moderno), que não consegue sair de seu “mundinho”. Exemplo é o que não falta para ilustrar tanta “sozinhez”.
          Dias atrás, em direção contrária à minha, caminhava um casal (?) de mãos dadas. Até aí, tudo bem, não é mesmo? Um casal é algo muito comum de ‘se’ ver. No entanto, cada um, em seu “universo particular”, parecia incansável no manuseio de seu próprio aparelhinho. Talvez estivessem jogando. Será que enviavam algum torpedo? Vai saber... Devo confessar que achei a cena inusitada. Esquisita até. Pareceu-me que, para o “casal” (com aspas), naquele momento, o prazer individual era só o contava. Será que não havia algum assunto interessante sobre o qual pudessem conversar? Nada?! Que coisa, não?!  O celular era muito mais importante que tudo.
          Ainda nessa canoa da solidão, há espaço para outra espécie de solitário. Ao contrário do que pensamos, nos “orkuts” (e afins) nossos de cada dia, também encontramos pessoas e mais pessoas que, sem o saber, desfrutam de uma solidão sem fim. Elas dizem ter muitos e muitos amigos (?). Gabam-se disso. E vivem ‘adicionando’ mais e mais “amigos”. Não faltam convites. E a lista é gigantesca. Infinda! Amigos nascem de afinidades e pronto. Posso dizer que, no FACEBOOK, com todos que adicionei, tenho, pelo menos, alguma afinidade. E por falar em amigos, é um bálsamo ouvir Renato Teixeira: “A amizade sincera é um santo remédio / é um abrigo seguro”.
          O fato de algumas pessoas não responderem aos tais “convites de amizade” talvez seja uma forma delicada e elegante de elas dizerem NÃO. Talvez essas pessoas só queiram os raros amigos, as raras amizades. Respeitemos, pois, esse querer.  

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