Egressa do grupo Rumo, Ná Ozzetti é, para muita gente, uma novata. Fiquei sabendo dessa moça quando li uma crítica sobre seu primeiro disco, batizado somente de Ná Ozzetti. O texto dizia que a gravação que ela fez de Sua estupidez, de Roberto e Erasmo, ficou extraordinária e superou, inclusive, a de Gal. Uh! Fiquei ansioso para conferir. Quem é essa mulher? Xeque-mate! A gravação é linda mesmo. Aliás, o disco todo é maravilhoso. Foi dele que extraí uma de minhas preferidas, No rancho fundo, do Ary Barroso: “No rancho fundo / De olhar triste e profundo / Um moreno canta as mágoas / Tendo os olhos rasos d’água (...)”. Quanta beleza! Essa canção já recebeu várias gravações antológicas. Também magistral, antológica é a de Ná, cujo canto cristalino nos deixa marcas indeléveis. Dá vontade de fugir para um rancho bem distante, “bem pra lá do fim do mundo”, onde haja muito mato, muita água e muita paz. Fugir do holocausto da cidade, do estresse do dia a dia. Seu Piano e voz, com o pianista André Mehmari, não pode ficar fora da discoteca de ninguém. Se mais não fosse, o disco valeria pela canção Rosa, de Pixinguinha e Otávio de Souza, um dos clássicos imortalizados por Orlando Silva e revisitado por Marisa Monte (Mais, 1994) e Caetano Veloso (Agô, Pixinguinha! 100 anos, 1997): “Tu és bonita e graciosa / Estátua majestosa / Do amor por Deus esculturada (...)”. Linda! Um perfeito redesenho das cantigas de amor trovadorescas. O disco Show traz diversos clássicos de nosso cancioneiro. Para ouvi-lo, basta deitar-se em uma rede e ‘viajar’. O canto de Ná é um acalanto. Quando a ouço, lembro-me de muitas águas. Talvez a de Ná seja a “voz de muitas águas” de que nos fala Caetano em Eu e água, imortalizada por Bethânia em seu Maria. A voz de Ná é, para mim, água de rio, que vai descendo, descendo, arrasta seixos e encontra o mar. Ná é transgressora. Ninguém se atreve a discordar disso. Ela ousa revisitar clássicos do cancioneiro e atribui a eles sua marca, sua cara, seu carimbo. E isso não é fácil, uma vez que as comparações são inevitáveis. Involuntariamente, as pessoas avaliam: “Gostei mais da gravação tal... ou “A gravação de fulano ficou melhor”. Quando ouvimos Ná, não ouvimos, por trás, a primeira gravação, ou as gravações anteriores. É possível que nos lembremos delas. No entanto, a de Ná ficou ‘tão sua’, que ouvimos Ná Ozzetti, uma glória. Ná é sem excessos. Ná é precisa. Ná é essencial.
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