terça-feira, 3 de maio de 2011

AO ENCONTRO DO MAR



Egressa do grupo Rumo, Ná Ozzetti é, para muita gente, uma novata. Fiquei sabendo dessa moça quando li uma crítica sobre seu primeiro disco, batizado somente de Ná Ozzetti. O texto dizia que a gravação que ela fez de Sua estupidez, de Roberto e Erasmo, ficou extraordinária e superou, inclusive, a de Gal. Uh! Fiquei ansioso para conferir. Quem é essa mulher? Xeque-mate! A gravação é linda mesmo. Aliás, o disco todo é maravilhoso. Foi dele que extraí uma de minhas preferidas, No rancho fundo, do Ary Barroso: “No rancho fundo / De olhar triste e profundo / Um moreno canta as mágoas / Tendo os olhos rasos d’água (...)”. Quanta beleza! Essa canção já recebeu várias gravações antológicas. Também magistral, antológica é a de Ná, cujo canto cristalino nos deixa marcas indeléveis. Dá vontade de fugir para um rancho bem distante, “bem pra lá do fim do mundo”, onde haja muito mato, muita água e muita paz. Fugir do holocausto da cidade, do estresse do dia a dia. Seu Piano e voz, com o pianista André Mehmari, não pode ficar fora da discoteca de ninguém. Se mais não fosse, o disco valeria pela canção Rosa, de Pixinguinha e Otávio de Souza, um dos clássicos imortalizados por Orlando Silva e revisitado por Marisa Monte (Mais, 1994) e Caetano Veloso (Agô, Pixinguinha! 100 anos, 1997): “Tu és bonita e graciosa / Estátua majestosa / Do amor por Deus esculturada (...)”. Linda! Um perfeito redesenho das cantigas de amor trovadorescas. O disco Show traz diversos clássicos de nosso cancioneiro. Para ouvi-lo, basta deitar-se em uma rede e ‘viajar’. O canto de Ná é um acalanto. Quando a ouço, lembro-me de muitas águas. Talvez a de Ná seja a “voz de muitas águas” de que nos fala Caetano em Eu e água, imortalizada por Bethânia em seu Maria. A voz de Ná é, para mim, água de rio, que vai descendo, descendo, arrasta seixos e encontra o mar. Ná é transgressora. Ninguém se atreve a discordar disso. Ela ousa revisitar clássicos do cancioneiro e atribui a eles sua marca, sua cara, seu carimbo. E isso não é fácil, uma vez que as comparações são inevitáveis. Involuntariamente, as pessoas avaliam: “Gostei mais da gravação tal... ou “A gravação de fulano ficou melhor”. Quando ouvimos Ná, não ouvimos, por trás, a primeira gravação, ou as gravações anteriores. É possível que nos lembremos delas. No entanto, a de Ná ficou ‘tão sua’, que ouvimos Ná Ozzetti, uma glória. Ná é sem excessos. Ná é precisa. Ná é essencial.

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