segunda-feira, 2 de maio de 2011

DIVINA É DIVINA E PONTO


Em se tratando de grandes vozes do Brasil, está aí Elizeth Cardoso, a “Divina”, título atribuído por Haroldo Costa. “Enluarada”, “Magnífica”, “Cantadeira do Amor”. Difícil encontrar outra cantora que tenha recebido tantos adjetivos. No entanto, mesmo sendo tão adorada e tendo sido tão adjetivada, Elizeth não ligava para “pompas”. Era simples demais. E era extraordinária. Quincy Jones, por exemplo, considerava-a uma das maiores cantoras do mundo. Nos últimos anos de vida, sua voz ficou mais bonita (se é que isso ainda era possível): ganhou um veludo que só mesmo o tempo pôde dar. Os graves ficaram mais profundos e mais sedutores. Elizeth era classuda, como dizem. Era nobre, requintada, sofisticada e moderna. Transgressora a toda prova, gravou, em 1958, Canção do amor demais, só com músicas de Jobim e Vinicius, marco, a despeito de controvérsias, da Bossa Nova. A revolucionária batida do violão de João Gilberto está nesse disco. Quem poderia imaginar que uma cantora da chamada “era do rádio” participaria de um projeto como o de Canção do amor demais? Outra gravação inesquecível em sua voz é a das Bachianas brasileiras n 5 – 1 parte da ária (cantilena), do maestro Villa-Lobos, que recebeu uma letra linda de David Nasser. Essa maravilha é algo transgressor e fora deste mundo, de tanta beleza: “Vai, por este céu vazio de esperança / Vai, minh’alma regressar / Para os meus, ao meu lugar / Este chão de todos nós (...)”. Impossível também é esquecer o álbum duplo Elizeth Cardoso ao vivo no Teatro João Caetano, com Zimbo Trio, Jacob do Bandolim e Época de Ouro. Trata-se do registro ao vivo de um dos melhores espetáculos da Música Popular Brasileira de todos os tempos. Salve, salve! Em Luz e esplendor, faixa que dá nome a um de seus últimos discos, a “Divina” vem inteira: “Artista o seu nome já nasce na lista / Dos que vão sangrar de paixão e dor (...)”. Em A mulata maior, de 1974, Elizeth registrou uma das mais belas canções de Nelson Cavaquinho e Guilherme de Brito, Quando eu me chamar saudade: “(...) Me dê as flores em vida / O carinho, a mão amiga / Para aliviar meus ais / Depois que eu me chamar saudade / Não preciso de vaidade / Quero preces e nada mais”. E por falar em saudade, que tremenda saudade de Elizeth! Buarque mesmo já disse que ela tem “voz de mãe, e mãe de todas as cantoras do Brasil”. Ela é muito amada e respeitada por todos.  Nossa Divina faz jus aos adjetivos que recebeu.

2 comentários:

  1. Fábio, queridíssimo. Você falou e disse. Seu texto está divino,literal e literariamente, creia!!! Genial a sua sacada com a qual concordo radical e pletoramente:"Nos últimos anos de vida, sua voz ficou mais bonita (se é que isso ainda era possível): ganhou um veludo que só mesmo o tempo pôde dar".Bingo!!! Intuía e sentia esta evidência mas não sabia colocar palavras tão pertinentes...eu falava que ela estava cantando para Deus , como uma verdadeira rainha... principalmente no arrebatador e avassalador "Luz e Esplendor" (não tenho talento ...faço rima pobre para algo que é luxo só!!! rs). "Faxineira das canções" é quase um abalo sísmico"rs...adooooooooro.O comentário do "Chique' Buarque é sagacíssimo e, não por acaso, ela é MÃEdrinha da melhor de todas, a kooraxiana I.K. Meu entusiasmo ou encantamento por ela surgiu através de um antigo amigo, professor e concertista de piano, em priscas eras rs (anos 70...você ainda engatinhava ou menos que isto, ainda não saía do colo). Sou antiqüíssimo com trema e tudo rs.Existia naqueles tempos idos - e bem mais chiques, como disse Rita Lee- um restaurante no Aeroporto que ainda era o Galeão, onde alguns artistas faziam shows. O pianista convidou-me, então, sem especificar a atração, para que eu tivesse uma surpresa pois, segundo ele, eu tinha muito bom gosto e certamente iria adorar.Até hoje eu tremo (além do trema e da trama rs) com a sensação ou a emoção daquele dia. Foi um impacto quando ela começou a emitir aqueles sons etéreos.Tive a impressão de ter sido catapultado para outra esfera, como se estivesse em suspensão.Imediatamente falei-lhe: se não baixou um santo em mim, então "me segura que tô tendo um troço"rs.Depois percebi que , na verdade, foi e ainda é...um banho de luz da enluarada, da iluminada, da divinamente divina, sempre quando tenho o privilégio de ouvi-la cantando em absoluto estado de graça.Beijaços.

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  2. Marcos, meu queridíssimo e "kooraxiano" amigo, seus escritos têm uma carga de emoção fantástica! Contagiam-nos! Que maravilha você ter podido assistir a um 'show' da "Divina"! Que privilégio, moço! Pois é, os deuses não me concederam tamanha iguaria, mas concederam a você, que, certamente, soube aproveitar por mim e por todos que estavam lá. Agora, no entanto, podemos, em êxtase, desfrutar de outra iguaria: os "shows" da afilhada da "Divina": nossa deusa IK. Aliás, não desfrutamos só dos 'shows', mas da amizade, do amor, do carinho dessa moça que é a "primeira dama da canção no mundo". Única! Um beijo, meu querido. Em breve, se Deus quiser, e Ele quererá, estarei no Rio.

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